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Instituto Clima e Sociedade completa dez anos apoiando a agenda climática e se movimenta para a COP30

Foto: Barbara Brito-Divulgacao/iCS

O Instituto Clima e Sociedade completou dez anos de atuação em 2025, em um cenário bastante peculiar: a realização de uma Conferência de Clima da ONU no Brasil, a COP30. Criada logo após o Acordo de Paris, em 2015, a organização apoia o enfrentamento das mudanças climáticas por meio do emprego de múltiplas abordagens e ferramentas, atuando junto a diversos segmentos da sociedade. 

Hoje são mais de 200 instituições apoiadas, desde o universo acadêmico até representações de sociedade civil, dos indígenas às comunidades periféricas do Rio de Janeiro. Desde a criação, foram mais de 400 apoiadas, somando R$ 580 milhões em doações.

Maria Netto, atual diretora executiva do iCS, conversou com a Rede Comuá sobre expectativas para a COP30, a contribuição do Instituto para a pauta climática nesses dez anos e a atuação, mais recente, na agenda da adaptação.

“O iCS fez questão de colocar recursos apartados para isso. E tem várias formas, de acordo com as necessidades, de trabalhar a agenda de adaptação. A primeira é reforçar a capacidade dos territórios e populações mais vulneráveis. A gente tem apoiado diferentes tipos de donatários: por exemplo, populações indígenas na Amazônia – vulnerabilizadas pelo aumento da temperatura, dos incêndios e queimadas -, pequenos agricultores no Cerrado – que também sofreram com a temperatura e seca -, populações de comunidades cariocas, que sofrem com ondas de calor. São problemas diferentes e cada um tem uma forma de se adaptar. Por outro lado, a gente também precisa de um trabalho científico, porque não adianta só reforçar essas comunidades sem pensar e ter ferramentas que mudem a forma de planejar.”

O Instituto Clima e Sociedade completa dez anos em 2025 apoiando o enfrentamento às mudanças climáticas por meio de múltiplas abordagens e ferramentas junto a organizações da sociedade civil. Que balanço você faz dessa atuação e da contribuição para o quadro nacional e mundial?

Há 10 anos, com a adoção do acordo de Paris, pela primeira vez a maioria dos países chegava à conclusão de que era preciso trabalhar juntos, tendo uma meta comum de dez anos à frente, para estabilizar os gases de efeito de estufa na atmosfera e manter o aumento da temperatura no máximo em 1.5 °C. Infelizmente, não chegamos tão próximos da meta, mas sabemos que o país tem – e sempre teve, desde aquela época – um potencial enorme de escalar as suas energias renováveis. Tem, e já tinha naquele momento, uma rede elétrica com uma pegada de carbono muito limpa e um grande potencial de reduzir emissões, além do potencial de remoção de gases de efeito de estufa. 

Naquele momento, o iCS ainda trabalhava para que a importância do tema fosse reconhecida, e muito do que fazia era no sentido de começar esse campo no Brasil. Como filantropia, atuava mais com foco em cidade, nas questões de transporte e energia. Crescentemente, foi entrando na questão principal, onde ocorrem as maiores emissões do Brasil: uso da terra. Também passamos por diferentes momentos políticos e, infelizmente, o desmatamento, por exemplo, que estava perto de zero, aumentou muito no país nos últimos anos, o que fez com que o iCS passasse a atuar cada vez mais nessa área. Hoje temos uma grande agenda de implementação, que precisamos fazer acontecer, acreditando que ela deve estar integrada com o desenvolvimento brasileiro, com a competitividade da nossa economia em relação ao resto do mundo e com os impactos para as pessoas no dia a dia. Portanto, a grande mudança do iCS de lá para cá foi avançar, a partir de uma ambição global, até a criação de um ecossistema no Brasil. 

Evento do Nature Investment Lab – Marcelo Pereira – Fotoka – Divulgação NIL

Hoje apoiamos mais de 200 instituições, desde o universo acadêmico até representações de sociedade civil, dos indígenas às comunidades periféricas do Rio de Janeiro. Todo mundo precisa estar envolvido nessa agenda. Ainda tivemos um papel fundamental nos últimos quatro anos para promover a necessidade de se manter a floresta em pé e de reverter o desmatamento na Amazônia. Ao mesmo tempo, promovemos o diálogo entre a sociedade civil, o setor privado e setor público, porque a implementação diz respeito a questões práticas: capacidade de investir, acesso a crédito, capacidade técnica para realizar projetos, entender as limitações e as oportunidades. Hoje não somos apenas financiadores, mas um espaço onde as entidades apoiadas conversam entre elas, trocam informações, geram conhecimento e trabalham juntas, porque ampliam seu impacto quando atuam como um ecossistema.  

Como vê a necessidade de se investir em adaptação às mudanças climáticas e de que forma o iCS vem atuando em relação ao tema?

De forma exponencial, a frequência e intensidade dos eventos climáticos vêm aumentando e a gente sentiu isso na pele, no ano passado, com as inundações no Sul, o aumento de temperatura na Amazônia, que levou a uma seca no Brasil inteiro, e os incêndios que vulnerabilizaram ainda mais as populações que naturalmente têm menos capacidade de responder e se adaptar. Tudo isso criou a necessidade, para o iCS, de promover a agenda de adaptação, porque não podemos mais evitar o fato de que esses eventos continuarão acontecendo. Portanto, não só precisamos reduzir as emissões e promover a nossa matriz energética limpa, como também trabalhar para capacitar, sobretudo os mais vulneráveis, para que possam responder aos impactos do clima.  

É preciso também entender como o planejamento dos governos e de investidores leva em consideração os impactos da não-ação, que são os impactos do clima. E como investir em atividades mais resilientes, por exemplo, nas infraestruturas costeiras, nas cidades, na qualidade de vida – sobretudo nas áreas periféricas, como as comunidades cariocas, por exemplo, onde as pessoas sentem as ondas de calor e não têm necessariamente um ambiente adequado para isso. Tudo isso cria novas necessidades e áreas de atuação para as quais o iCS está olhando com mais cuidado, tais como o impacto em comunidades, territórios, saúde, infraestruturas. Sem esquecer da agricultura, porque o Brasil depende muito do setor econômico agrícola, que é particularmente vulnerável à mudança do clima.

O Instituto tem como visão um Brasil carbono negativo com crescimento e justiça social até 2100, compatível com 1.5 graus. Como estamos, como país, nesse caminho, inclusive nas questões de adaptação? 

O Brasil tem grande vantagem porque possui oportunidades únicas a nível global, com as suas soluções baseadas na natureza, a possibilidade de remover gás de efeito estufa e a recuperação de pastagens e de áreas degradadas, por exemplo. Além disso, no setor energético, nossa matriz é muito limpa, que pode ser escalada e oferecer oportunidades de grandes investimentos e criar cadeias de valor, inclusive para atrair indústrias internacionais. Agora, para que isso se transforme em vantagem competitiva é preciso entender como essas oportunidades podem ser desenvolvidas, e pensando, sobretudo, no benefício local. O iCS tem olhado para a possibilidade de atrelar essas oportunidades a um pensamento de desenvolvimento territorial, de oferecer energia renovável criando cadeias de investimentos – que sejam indústrias de abatimento de gás efeito estufa caro, que gerem empregos, renda e benefícios para a sociedade. Para isso, a gente precisa olhar a agenda do clima vinculada a uma visão ampla de desenvolvimento local.  

O mesmo acontece com a agenda de adaptação. Como já atingimos um nível de temperatura média global que leva a impactos cada vez mais frequentes e intensos, é preciso mudar a forma de pensar e planejar as cidades, a agricultura etc. Temos um grande desafio, até do sistema financeiro como um todo, que fica vulnerável frente a esses impactos econômicos. No ano passado, na inundação no Sul, apenas 5% das perdas eram asseguradas. Isso é muito grave. São perdas econômicas na veia dos governos subnacionais, do federal e do setor privado. Como inverter isso? O Brasil ainda tem muito por fazer. Precisamos criar ferramentas, capacidade de poder, entender melhor essas vulnerabilidades e integrá-las no planejamento de investimento de longo prazo do setor privado, dos bancos, dos seguros, do governo. Esses riscos hoje não estão bem contabilizados. E o iCS considera importante ajudar o Brasil a integrar esses riscos, a se preparar melhor, a entender que o custo de se adaptar, de ter uma infraestrutura resiliente, de mudar uma prática de agricultura pode parecer alto no curto prazo, mas no longo prazo é menor. Porque os riscos que antigamente se considerava “de força maior” passaram a ser recorrentes. 

Em outras palavras, temos um trabalho grande a ser feito, que requer conscientização dos setores econômicos, dos governos. E as populações mais afetadas precisam ter capacidade de participação para pedir, de forma sofisticada, o que precisam. 

Esse é um ano particularmente movimentado em relação ao clima para o Brasil, com a realização da COP30 em Belém e um claro chamado à ação. Quais são as expectativas para o evento?

A gente vê a COP 30 como vitrine de oportunidades para o Brasil. Primeiro, para mostrar o quanto o país pode ajudar nessa agenda. Por exemplo, o iCS tem apoiado muito a escalagem da bioeconomia, a restauração de áreas degradadas, tem feito um trabalho grande no Nordeste para mostrar o seu potencial de trazer investimentos em indústrias descarbonizadas, além do trabalho com comunidades indígenas, com projetos para reduzir a vulnerabilidade a incêndios na Amazônia etc. E a gente pode mostrar que já existe no Brasil uma sociedade e um setor privado pujantes que estão fazendo coisas no terreno. Em segundo lugar, claro, esperamos que a COP 30 seja um sucesso e traga para a próxima década o nível de ambição que precisamos. A gente terá uma meta, de dez anos, que vamos precisar cumprir. Que seja uma meta ambiciosa, de continuar a agenda de 1.5 °C, de manter o Acordo de Paris vivo e de mostrar que vamos conseguir levantar o financiamento necessário para essa implementação. Pensando na geopolítica global, um ponto importante é reforçar o papel que o Brasil pode ter no multilateralismo e a necessidade, apesar de certos países não estarem no jogo do multilateralismo, de fazermos a agenda avançar. Porque a gente precisa de uma solução global.

IEPE/Divulgação

Muito tem se falado, nesse caminho rumo à COP30, sobre adaptação e apoio a soluções locais elaboradas por grupos e comunidades para seus territórios, uma agenda que vinha tendo pouco destaque. Como o iCS vê o financiamento para essa agenda, e como tem atuado em apoio a ela junto à sociedade civil?

Essa é uma agenda que, como eu disse, integramos recentemente. Os doadores internacionais tendem a ver isso como um problema local, então, muitas vezes, a dificuldade de financiar e apoiar a adaptação vem do fato de que ela é localizada. Estamos falando de populações vulneráveis sendo mais impactadas: se você já vive mal e acontece uma onda de calor, uma inundação, uma seca, você vai sofrer mais os impactos. Mas, infelizmente, quando se fala de recursos internacionais, o interesse pelo Brasil costuma ser maior como solução global para mitigação, e menor como apoio para a melhoria local, que nem sempre tem benefícios aparentes. É neste ponto que a filantropia nacional tem um papel particularmente importante de colaborar. 

O iCS fez questão de colocar recursos apartados para isso. E tem várias formas, de acordo com as necessidades, de trabalhar a agenda de adaptação. A primeira é reforçar a capacidade dos territórios e populações mais vulneráveis. A gente tem apoiado diferentes tipos de donatários: por exemplo, populações indígenas na Amazônia – vulnerabilizadas pelo aumento da temperatura, dos incêndios e queimadas -, pequenos agricultores no Cerrado – que também sofreram com a temperatura e seca -, populações de comunidades cariocas, que sofrem com ondas de calor. São problemas diferentes e cada um tem uma forma de se adaptar. Por outro lado, a gente também precisa de um trabalho científico, porque não adianta só reforçar essas comunidades sem pensar e ter ferramentas que mudem a forma de planejar. 

Poderia citar alguns projetos apoiados pelo iCS?

Continuando no âmbito da adaptação, apoiamos trabalhos importantes, como a plataforma Adapta Brasil, gerida pelo INPE, que ainda não tem granularidade e informações que possam ser usadas como ferramentas de planejamento pelas populações locais, governos, seguradoras, bancos, investidores. Então, temos feito um esforço para reforçar e melhorar a utilização e o formato dessa plataforma, para prever quais zonas vão ter mais calor, mais chuvas, mais secas. Como vou planejar uma casa em zona costeira? Como planejar uma área agrícola e mudar minhas práticas? 

Já na área de bioeconomia, atuamos, por exemplo, com a cadeia de castanha do norte amazônico. Como torná-la mais atrativa, promovendo a floresta em pé e a criação de benefícios para a população local? Como ajudar a bioeconomia da castanha, do açaí e de outros produtos amazônicos? Temos visto a necessidade de trabalhar com diferentes tipos de articulações, como o Redário, apoiando viveiros e sementários para viabilizar uma escala de espécies nativas. A gente também ajuda startups e organizações para estimular a formação de cooperativas, porque pequenos produtores devem trabalhar juntos, e precisam de crédito, de um mercado e de infraestrutura para chegar ao comprador.

O iCS tem olhado as coisas de forma ecossistêmica. Não só na área de bioeconomia, mas também na descarbonização da indústria e nos renováveis no Nordeste. O Brasil tem potencial de atrair investimentos internacionais, que chamamos de powershoring, mas antes precisamos capacitar os governos subnacionais para fazerem o planejamento local.  Atuamos com organizações do Nordeste que fazem estudos de potencial e acompanham os governos na criação de uma “fábrica de projetos”, entendendo o que precisa ser feito para atrair investimentos que tragam uma perspectiva local e ajudar a incluir as populações nos desenhos desses projetos. 

Formação de mulheres brigadistas indígenas pelo CIR – iCS divulgação

E o financiamento também é fundamental porque é preciso escalar investimentos para garantir muitas das iniciativas de bioeconomia, de restauração florestal, de agricultura regenerativa, inclusive a familiar. Por isso, criamos um programa chamado Nature Investment Lab, um laboratório para promover investimentos na natureza, envolvendo gestores de fundos, bancos, desenvolvedores de projeto, com mais de 200 atores que trabalham essa agenda sob diferentes pontos de vista, para discutir como destravar esses investimentos.

Por fim, acho legal um trabalho único que o iCS tem feito com populações indígenas, um projeto bonito que apoiamos com o CIR, o Centro de Indígenas de Roraima. Trata-se de um centro de sistema de gestão, uma sala, onde indígenas passam 24 horas identificando se a região vai ter ou não possibilidade de sofrer um evento ambiental, em particular incêndios, podendo fazer previsões até uma semana antes. E mulheres brigadistas indígenas são acionadas para apagar o fogo. Ou seja, eles se tornaram parte da solução, transformando-se numa grande potência de redução e de prevenção de incêndios.

O que se projeta para os próximos 10 anos do Instituto?

Vamos continuar acompanhando o Brasil. Temos claro que, cada vez mais, a agenda deve ser de implementação integrada ao desenvolvimento econômico, e que o ecossistema precisa estar cada vez mais capacitado e próximo da realidade do dia a dia das pessoas e da economia. Vamos seguir trabalhando para manter essa agenda no longo prazo e fixá-la como política de estado, independentemente de governos, com institucionalidade e relevância. Qualquer retrocesso implicará num custo muito alto para a sociedade e para a economia. Na agenda de adaptação haverá muito mais trabalho, infelizmente. Mas a gente também acredita que a mitigação e a implementação estão em todas as áreas que atuamos: uso da terra, energia, indústria, fortalecimento de instituições, marcos regulatórios, e as populações e a sociedade continuarão sendo prioridades para o iCS. Para nós, a agenda do clima é parte do nosso desenvolvimento, e uma oportunidade para o Brasil se posicionar como grande solução, porque temos oportunidades que nenhum outro tem.

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