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Minha jornada na Rede Comuá: conquistas, desafios e agradecimentos

Minha jornada na Rede Comuá: conquistas, desafios e agradecimentos

Foto: Rede Comuá

Por: Graciela Hopstein

Após sete anos na direção executiva da Rede Comuá, encerro minha gestão no mês de setembro de 2024 com a sensação de ter contribuído de forma significativa para a consolidação de um ator estratégico no campo da filantropia brasileira. Foram anos intensos e, apesar dos inúmeros desafios enfrentados, foi uma experiência muito enriquecedora e bonita, com grandes resultados e conquistas. 

A Rede é hoje um ator político reconhecido no campo da filantropia nacional, regional e internacional, ocupando um lugar estratégico e destacado nos ecossistemas, principalmente na promoção de agendas vinculadas à filantropia independente de justiça socioambiental e comunitária no Sul Global. É uma referência no grantmaking brasileiro, especialmente junto a atores diversificados da sociedade civil que atuam com foco na luta pelo reconhecimento e conquista por direitos.    

Mas o percurso até chegar aqui não foi fácil: inúmeros desafios foram enfrentados, tanto no âmbito da filantropia como no cenário político. 

Quando a Rede surgiu, em 2012, foi um impacto para a filantropia brasileira porque ela veio para chacoalhar, para provocar, não apenas em termos de agendas, mas também nas formas de entender e fazer filantropia. Eu sempre faço a analogia da Rede Comuá ser uma pimentinha: é pequena, mas bem ardida e forte… e certamente ela não passa despercebida, embora nem sempre seja convidada para as festas. Mas enfim, a Rede chegou para ficar, e isso não tem volta, principalmente pelo papel estratégico que a Comuá ocupa no financiamento à sociedade civil e, portanto, no fortalecimento da democracia brasileira. 

Quando assumi a condução da Rede, o país enfrentava uma crise profunda: desde o impeachment da Dilma Rouseff em 2016, ao assassinato da Mariele Franco em 2018, culminando com a eleição de Bolsonaro naquele mesmo ano, o cenário políico estava literalmente em chamas, situação que certamente teve impactos significativos para a sociedade civil, e especialmente para os atores que atuam no campo progressista. E ainda em 2020 enfrentamos a pandemia da covid-19, que no Brasil ceifou a vida de mais de 700 mil pessoas, tragédia que foi consequência do negacionismo e da ausência de políticas públicas voltadas ao cuidado integral da população. 

Apesar do contexto adverso e hostil, ao longo desses anos complexos o campo da filantropia conseguiu se amalgamar, se unir em prol das populações mais vulneráveis e dar respostas à crise a partir de doações significativas, de articulações entre múltiplos atores e de diversos arranjos colaborativos. De fato, tínhamos inimigos externos comuns que precisávamos enfrentar. 

Certamente, hoje estamos em outro cenário, mais esperançoso e menos hostil, mas infelizmente fomos perdendo aos poucos a capacidade de doação, a força colaborativa e as articulações estratégicas. 

Ainda estamos enfrentando momentos muito desafiadores, não apenas porque continuamos lidando com a ameaça da extrema direita e das pautas conservadoras, que podem implicar a regressão no campo dos direitos conquistados, mas porque estamos vivendo a crise climática, que hoje se apresenta como uma agenda urgente e prioritária, considerando que os desastres naturais e eventos extremos são cada vez mais frequentes, colocando em risco a vida de grupos significativos da população, especialmente (e mais uma vez) dos mais vulneráveis. 

Mas o campo da filantropia também está atravessando uma crise profunda porque é evidente que não está conseguindo responder de forma dinâmica, com recursos financeiros e investimentos significativos, às múltiplas emergências que a sociedade civil está enfrentando, tanto no campo do acesso a direitos como no contexto da crise climática. 

Quando assumi a direção da Comuá em 2017, a Rede estava passando por uma crise institucional profunda em diversos níveis (de recursos, de gestão, de identidade, de perspectivas futuras), situação que inclusive chegou a colocar em questão a continuidade da sua atuação. Foi uma situação muito complexa, porque além de tudo tínhamos muitos desafios internos e precisávamos nos organizar, dando um novo sentido à sua existência. 

Em 2017 éramos nove membros, hoje a Rede conta com 18 associados e com um programa de incidência sólido, voltado para o engajamento e fortalecimento de membros, com visíveis ações de articulação no campo, de comunicação e produção de conhecimento que posicionaram a Rede como um ator estratégico.

A mudança de nome para Rede Comuá – que está ligado à noção do comum, de comunidade – foi um divisor de águas no seu posicionamento. A criação do Programa Saberes em 2022, que até o momento apoiou 16 pessoas bolsistas, lideranças comunitárias e da sociedade civil para a produção de conhecimento no campo da filantropia comunitária, também representa uma grande conquista. Por sua vez, o seminário de 10 anos da Rede e as duas edições do Mês da Filantropia que Transforma também representam marcos nessa trajetória. 

Foram lançadas 10 publicações originais, e certamente a pesquisa de mapeamento sobre o campo da filantropia independente foi relevante para o ecossistema, porque é um estudo inédito, que demonstra a potência da sua atuação e apresenta uma forma diferente (no sentido amplo) de fazer filantropia.  

A Rede hoje é um ator institucionalizado que consegue pautar o campo, principalmente nas agendas de filantropia comunitária, de justiça socioambiental e a sua relevância para o fortalecimento da sociedade civil e da democracia. 

Poderia citar aqui várias outras conquistas, mas para não me alongar, encerro a minha gestão com a sensação de dever cumprido, de ter contribuído de forma significativa com o campo e feliz por estar passando o bastão para Jonathas, uma liderança jovem que certamente inaugura uma outra etapa na condução da Comuá. 

Fazendo um balanço geral, acredito que a minha gestão na Rede foi muito produtiva e desafiadora, e me despeço com o coração cheio de afeto e carinho. 

Mas certamente, não poderia ter chegado aqui sem o apoio dos membros, dos parceiros e dos financiadores. Ressalto especialmente aqui o apoio da Cris Orpheo, que sempre acolheu a gestão financeira dos recursos da Rede com total disponibilidade e abriu tantas portas para a Comuá. À Ana Toni, que ofereceu a estrutura do iCS para a gestão financeira de projetos e colaborou com tantas conexões e articulações. Ao conselho de governança e, especialmente, à Ana Valéria, que me apoiou em tantos momentos desafiadores e em especial neste processo de transição. 

Queria agradecer especialmente à equipe executiva da Rede Comuá, que trabalhou de forma incansável, sempre de forma amalgamada, fluida e amorosa, dando leveza às empreitadas e assumindo inúmeros desafios. 

Agora começa uma nova etapa para a Rede Comuá e na minha vida pessoal e profissional. Gostaria de finalizar este texto de despedida com uma frase do Frei Beto, que acho apropriada para este momento: “o segredo da felicidade está no desapego do dinheiro, do poder e, o mais difícil de tudo, de si mesmo”. 

Longa vida à Rede Comuá! Hasta la victoria, siempre!

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