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Um ano tecendo em rede

Por Roberto Vilela e Simone Amorim

Recentemente, a Tabôa Fortalecimento Comunitário publicou seu Relatório de Atividades de 2020. Produzir um relatório anual é sempre uma oportunidade de revisitar a prática e lançar luz sobre os processos vividos, evidenciando resultados, impactos e aprendizados gerados. E, em se tratando de um ano tão atípico quanto 2020, torna-se ainda mais importante a tarefa de sistematizar as principais reflexões e lições aprendidas, buscando fortalecer a resiliência institucional e a capacidade de contribuir para transformar positivamente a realidade.

A pandemia de Covid-19 instaurou uma crise sem precedentes. Atingiu a todos, mas de forma ainda mais grave àqueles que já se encontravam em situação de vulnerabilidade, devido a processos históricos de desigualdades. Coletivos e organizações da sociedade civil também foram fortemente impactados e precisaram rapidamente criar estratégias para continuarem existindo e atuando nesse novo e difícil contexto.

Não foi diferente com a Tabôa. Diante da situação de emergência – e inspirados nos aprendizados obtidos na operação de enfrentamento do derramamento de petróleo ocorrido, pouco antes, no litoral do Nordeste -, adaptamos nosso planejamento e incorporamos iniciativas de caráter humanitário para apoiar grupos e populações em vulnerabilidade em Serra Grande (Uruçuca/BA) e entorno, bem como em outros territórios de atuação institucional.

Assumindo a cooperação como princípio e como prática, apostamos em arranjos colaborativos de atuação, articulando e fortalecendo redes multiatoriais, visando ampliar a capacidade de resposta aos efeitos da pandemia. Aprofundamos ainda mais os diálogos com os grupos de base, mobilizamos recursos junto aos financiadores institucionais, que fizeram doações suplementares às regulares, e lançamos uma campanha para doações de pessoas físicas.

Mesmo em um cenário adverso, em 2020, a Tabôa dobrou o volume de recursos captados em relação ao ano anterior, impulsionada pelo papel que desempenhou no enfrentamento da Covid-19 e também pela ampliação de seus programas de atuação.Especificamente para as ações emergenciais, foram captados R$ 843 mil investidos em diferentes linhas de trabalho, que incluíram a promoção de segurança alimentar, o fortalecimento de agricultores familiares, coletivos, associações e empreendedores comunitários, assim como a disseminação de informações sobre prevenção ao novo coronavírus.

Dentre as iniciativas implementadas, o projeto [1] apoiado pela Rede de Filantropia para a Justiça Social, da qual a Tabôa é membro desde 2017, permitiu dinamizar uma rede de cooperação local para enfrentamento da pandemia em Serra Grande (Uruçuca/BA), por meio da articulação de quatro iniciativas comunitárias, cujas atuações têm contribuído para a garantia de direitos de grupos populacionais impactados pela Covid-19, como crianças, mulheres, idosos, dentre outros. As ações incluíram doações de recursos para continuidade das atividades no contexto da pandemia e o acompanhamento técnico para desenvolvimento de capacidades de monitoramento e sistematização das iniciativas apoiadas, buscando fomentar processos de aprendizagem e fortalecimento dos atores locais.

Com as devidas adaptações e seguindo os protocolos de segurança, conseguimos também implementar atividades já previstas em nosso planejamento para o triênio 2020-2022. E inovamos com o lançamento do primeiro CRA (Crédito de Recebíveis do Agronegócio) Sustentável na Mata Atlântica, um fundo de finanças híbridas que captou R$ 1 milhão para a carteira de crédito da Tabôa, apoiando negócios de impacto socioambiental liderados por 155 famílias agricultoras no Sul da Bahia.

Em 2020, pelo terceiro ano consecutivo, estivemos entre as 100 organizações vencedoras do Prêmio Melhores ONGs, considerando temas como gestão e planejamento, estratégia de financiamento, comunicação e prestação de contas.

A pandemia ainda não acabou e, embora precisemos de mais tempo para melhor compreender esse momento histórico e suas implicações em diferentes níveis, a análise da prática em 2020 nos sugere alguns caminhos a serem fortalecidos, que destacamos abaixo.

Arranjos colaborativos: ações e resultados compartilhados em nosso Relatório de Atividades nos sinalizam a importância de fortalecer redes de cooperação entre diferentes atores do território, uma vez que questões coletivas exigem respostas coletivas. A experiência da Tabôa em arranjos colaborativos – como a Muká Plataforma Agroecológica – foi fundamental para responder à crise, mobilizando e articulando diferentes tipos de recursos.

Fortalecimento da base: a pandemia mostrou a necessidade de reforçar 0um dos princípios e objetivos da Tabôa, que é o desenvolvimento comunitário, por meio do fortalecimento de autonomias e capacidades de atuação em rede. O fato de já atuarmos em estreita sinergia com lideranças, coletivos e organizações de base permitiu o mapeamento das necessidades mais urgentes, maior capilaridade e agilidade na construção de respostas para a crise no contexto comunitário.

Capacidade de inovação: a criatividade e o desenho de estratégias inovadoras são importantes ativos organizacionais para atuar em situações de crise. Foi o que nos mostrou, em 2020, a experiência do CRA Sustentável na Mata Atlântica, iniciativa concebida e realizada em rede pela Tabôa e parceiros, que trouxe uma forma inovadora de captação de recursos filantrópicos e de mercado para o fortalecimento da agricultura familiar.

Produção de conhecimentos e aprendizagem entre pares: a situação emergencial disparada pela pandemia mostrou a importância de gerar e compartilhar conhecimentos sobre e a partir das realidades de atuação. Ficou evidente a relevância de investirmos no desenvolvimento de capacidades de sistematização e fortalecimento de espaços de aprendizagem intra e interorganizacional, que priorizem a inteligência coletiva e a construção colaborativa de soluções, a partir do permanente diálogo com os contextos sociais.

As reflexões acima não esgotam as possibilidades de interpretação da prática e construção de aprendizados. Mas reforçam a importância de seguirmos fortalecendo uma cultura de cooperação como meio de construção de um mundo socialmente mais justo e sustentável.

Para ler a íntegra de nosso Relatório de Atividades de 2020, acesse aqui.


[1] A experiência do projeto foi sistematizada em vídeo, que pode ser assistido aqui.

Roberto Vilela de Moura Silva é Diretor Executivo da Tabôa. Formado em Administração de Empresas e mestre em Administração Pública e Governo pela EAESP-FGV, é especialista em microcrédito e microfinanças.

Simone Amorim coordena a comunicação da Tabôa. É comunicadora e mestre em Desenvolvimento e Gestão pela Universidade Federal da Bahia, com forte atuação junto a organizações sociais.

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