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Brigadas indígenas desempenham importante papel na proteção da Amazônia, mas ainda carecem de apoio

Brigada voluntária da Associação APITC da TI Caititu durante o treinamento para os brigadistas. Foto: Associação APITC

Por Angelo Ricardo Sousa Chaves – Gestor de Programas do Fundo Casa Socioambiental

A Amazônia é a maior floresta tropical do mundo, responsável por 40% do remanescente dessa formação florestal. Quinze por cento de toda a água doce que chega aos oceanos provém da Bacia Amazônica, a maior bacia hidrográfica do planeta, que desempenha um papel crucial na regulação do clima global. A biodiversidade é fonte de sustento de grande parte dos 29,8 milhões de habitantes dos estados da Amazônia Legal, especialmente dos povos indígenas, que correspondem a 51,25% da população indígena do Brasil. No entanto, a região enfrenta desafios crescentes, como o desmatamento e os incêndios florestais, que ameaçam não apenas o ecossistema, mas também a sobrevivência das populações e comunidades tradicionais originárias. 

Nesse contexto, o apoio financeiro oriundo da filantropia, de governos e do setor privado destinado às organizações de base comunitária indígenas pode ser essencial para o fortalecimento da capacidade de gestão e proteção territorial, o enfrentamento de ameaças ambientais, como os incêndios florestais, e a resiliência aos impactos causados pelas mudanças climáticas. O Fundo Casa Socioambiental, atendendo às demandas das comunidades, vem empenhando esforços significativos para proporcionar apoios que possam contribuir para a mitigação desses impactos.

O importante papel das terras indígenas contra o desmatamento

As terras indígenas na Amazônia são grandes barreiras frente ao desmatamento. Estudos comprovam que os povos indígenas e povos tradicionais são responsáveis, juntos, pela proteção de um terço das florestas no Brasil. Nas últimas décadas, as Terras Indígenas foram responsáveis pela proteção de 20% do total das florestas nacionais. Na Amazônia brasileira, as comunidades indígenas protegem e manejam 27% das florestas, que armazenam 27% dos estoques de carbono da região, representando aproximadamente 13 bilhões de toneladas. 

Essas áreas, gerenciadas pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas – FUNAI e pelas organizações dos próprios povos indígenas através da implementação dos seus Planos de Gestão Territorial e Ambiental (PGTAs), apresentam taxas de desmatamento substancialmente menores em comparação com regiões não protegidas. Isso ocorre porque os povos indígenas detêm um profundo conhecimento e uma relação de pertencimento com os territórios, sendo verdadeiros guardiões e protetores, a partir dos seus próprios modos de vida. No entanto, para viabilizar a governança, manter esses ecossistemas naturais, promover a proteção e o monitoramento territorial, é essencial que as organizações que representam esses povos originários tenham acesso a recursos financeiros para fortalecer suas capacidades.

Mapa de três Terras Indígenas (TIs) ilustrando bem a importância dessas TIs como barreiras para o desmatamento

Brigadas voluntárias no combate aos incêndios florestais

Os incêndios florestais têm se intensificado nos últimos anos na Amazônia, impulsionados principalmente por atividades ilegais, como o desmatamento e a grilagem de terras, além das mudanças climáticas. Na Amazônia, 17,9 milhões de hectares foram afetados por queimadas em 2024, o que equivale a 58% de toda a área aquinhoada no Brasil, sendo que desse total, 6,8 milhões de hectares foram atingidos por incêndios florestais em florestas nativas, ou seja, um prejuízo inestimável para a biodiversidade.  

Apesar de 2024 ter sido um ano atípico em função do fenômeno “El Niño” e de um número muito elevado de ocorrência de incêndios criminosos, é extremamente preocupante essa perda de biodiversidade, o aumento das emissões atmosféricas e a vulnerabilidade a que os territórios estão expostos. Nesse cenário, as brigadas voluntárias indígenas têm se tornado cada vez mais importantes no enfrentamento aos incêndios florestais, desenvolvimento de técnicas mais adequadas de manejo integrado do fogo, monitoramento e vigilância de seus territórios. 

Essas brigadas são formadas por membros das comunidades e aldeias, que vivem e conhecem os ambientes locais, o que facilita muito a atuação na linha de frente dos combates utilizando técnicas tradicionais, treinamentos e equipamentos modernos que ajudam no controle dos focos de incêndio. No entanto, a falta de equipamentos adequados, como EPIs, GPS, drone, estruturas de transporte (lanchas, carros, quadriciclos, triciclos, motos), equipamentos de internet via satélite e outras ferramentas e equipamentos específicos, acaba limitando a eficácia dos trabalhos. Por isso, o apoio financeiro é crucial para que essas brigadas possam dar respostas rápidas aos incêndios, principalmente porque estão nos territórios e, muitas vezes, são a única alternativa para salvar a floresta e a biodiversidade.

Neste contexto, o Fundo Casa Socioambiental apoiou recentemente, através da chamada “Fortalecendo a autonomia e resiliência dos Povos Indígenas para o enfrentamento aos incêndios florestais e monitoramento de seus territórios”, 30 projetos, envolvendo 39 terras indígenas localizadas nos Estados da Amazônia Legal. As organizações apoiadas desenvolveram diversas atividades e estratégias que permitiram atingir maiores capacidades de atuação nos seus territórios e, portanto, importantes resultados, apesar dos grandes desafios que as dimensões continentais e a complexidade da região amazônica apresentam.

Destacam-se, assim, as parcerias para realização dos cursos de formação das brigadas com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis – IBAMA, através do Centro Nacional de Combate aos Incêndios Florestais – PREVFOGO, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio e Corpo de Bombeiros, que são os órgãos públicos especializados para promover as formações de brigadas. Foram realizadas 167 (cento e sessenta e sete) atividades, incluindo palestras, treinamentos, cursos e oficinas.  

Os cursos para formação capacitaram 347 novos brigadistas com a criação de 14 novas brigadas, aquisição de equipamentos, fardamentos e EPIs. Ao longo do desenvolvimento das atividades apoiadas pela chamada, foram envolvidas diretamente 8.210 (oito mil, duzentos e dez) pessoas, dentre essas 2.977 (dois mil novecentos e setenta e sete) mulheres. O que evidencia o importante papel das mulheres na defesa dos seus territórios e o reconhecimento desse protagonismo pelo Fundo Casa. 

A chamada proporcionou também a compra de mais de 300 kits de combate aos incêndios florestais, 264 equipamentos como sopradores, roçadeiras, motosserras, drones, máquinas fotográficas, celulares, entre outros, os quais são de fundamental importância tanto para o combate aos incêndios florestais quanto para o monitoramento e vigilância territorial. 

O uso de drones, por exemplo, facilita muito o planejamento dos combates aos incêndios, uma vez que possibilita visualizar a área que o fogo já atingiu e em que sentido está avançando em tempo real. Foi apoiada, ainda, a compra de cinco lanchas com motores para apoiar na logística das organizações. A logística é um ponto fundamental para que as brigadas possam atuar de forma eficiente, pois, muitas vezes, para um único combate é necessário fazer o deslocamento por via terrestre através de carros tracionados, por vias fluviais em barcos e lanchas, por via aérea utilizando aviões e helicópteros de pequeno porte.

Brigadas voluntárias atuando no combate aos incêndios florestais na TI Apiaká Kaiabi. Foto: Associação Indígena Inha-Apiaka

Integração com órgãos governamentais

A eficácia do combate e enfrentamento aos incêndios florestais nos territórios depende de uma atuação integrada entre comunidades indígenas e órgãos governamentais, como a Fundação Nacional dos Povos Indígenas – FUNAI, o Centro Nacional de Combate aos Incêndios Florestais – PREVFOGO, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio e o Corpo de Bombeiros Militar dos Estados. 

Os treinamentos conjuntos, a troca de conhecimentos entre os saberes tradicionais indígenas e as técnicas modernas de combate e manejo integrado do fogo, assim como um canal de comunicação estabelecido entre as partes, são estratégias que podem resultar em excelentes resultados. Além disso, a colaboração com esses órgãos fortalece a legitimidade das ações das Brigadas Voluntárias Indígenas e promove o reconhecimento de seu papel como primordial na defesa dos territórios, conservação da biodiversidade e enfrentamento às mudanças climáticas.

Contribuição para a conservação da biodiversidade e mitigação das mudanças climáticas

A preservação dos territórios indígenas proporciona inúmeros benefícios para a humanidade. Dentre os mais importantes estão: a preservação da cultura ancestral dos povos, a conservação da biodiversidade e a mitigação das mudanças climáticas. 

A Amazônia é um dos biomas que mais absorve carbono da atmosfera no planeta, e isso torna a sua preservação vital para o equilíbrio climático global. Portanto, ao apoiar financeiramente as estratégias de cuidado e proteção das terras indígenas criadas pelos próprios indígenas, se fortalece todos os serviços ecossistêmicos que esses territórios promovem e que são essenciais para todas as formas de vida na terra, principalmente para quem está nos grandes centros urbanos, com altas concentrações de população, alto consumo de energia, alimentação e água. 

Além disso, suas práticas tradicionais, de manejo sustentável dos recursos naturais, não visando grandes lucros e conservand a natureza, são exemplos de como é possível manter os ecossistemas naturais, contribuindo para o equilíbrio climático planetário e beneficiando seus povos.

Brigada voluntária da TI Boa Vista do povo Mura durante treinamento da brigada. Foto: Organização das Lideranças Indígenas Mura de Careiro da Várzea – OLIMCV

Contribuição para a conservação da biodiversidade e mitigação das mudanças climáticas

A preservação dos territórios indígenas proporciona inúmeros benefícios para a humanidade. Dentre os mais importantes estão: a preservação da cultura ancestral dos povos, a conservação da biodiversidade e a mitigação das mudanças climáticas. 

A Amazônia é um dos biomas que mais absorve carbono da atmosfera no planeta, e isso torna a sua preservação vital para o equilíbrio climático global. Portanto, ao apoiar financeiramente as estratégias de cuidado e proteção das terras indígenas criadas pelos próprios indígenas, se fortalece todos os serviços ecossistêmicos que esses territórios promovem e que são essenciais para todas as formas de vida na terra, principalmente para quem está nos grandes centros urbanos, com altas concentrações de população, alto consumo de energia, alimentação e água. 

Além disso, suas práticas tradicionais, de manejo sustentável dos recursos naturais, não visando grandes lucros e conservand a natureza, são exemplos de como é possível manter os ecossistemas naturais, contribuindo para o equilíbrio climático planetário e beneficiando seus povos.

Fortalecimento e valorização das organizações, da cultura e dos conhecimentos tradicionais

Para que as comunidades indígenas possam desempenhar plenamente seu papel na proteção da Amazônia, é necessário fortalecer suas organizações em termos de capacidades operacionais, gestão administrativa e financeira, manejo sustentável dos recursos naturais, vigilância, proteção e monitoramento territorial, além de outras atividades peculiares de cada território. 

O Fundo Casa Socioambiental ouve e compreende os processos e as dinâmicas desses povos. Por isso, tem dedicado esforços para se tornar um importante instrumento de apoio às organizações de base na linha de frente da defesa dos territórios. O apoio financeiro às comunidades indígenas também contribui para a valorização de sua cultura e conhecimentos tradicionais, viabilizando encontros, formações, oficinas, intercâmbios e geração de conhecimento. Esses saberes, transmitidos de gerações para gerações, são fundamentais para a preservação de culturas milenares e para a construção histórica do Brasil. 

Contribuição do Fundo Casa para o desenvolvimento sustentável na Amazônia

Ao fortalecer as capacidades das organizações locais, através do apoio financeiro direto que permite a aquisição de equipamentos, fortalecimento da logística, assessorias técnicas, promoção da integração com órgãos governamentais, criação de redes de articulações, suporte ao desenvolvimento das cadeias produtivas da sociobiodiversidade e muitas outras ações, amplia-se a eficácia na atuação das organizações comunitárias. Essa é uma estratégia essencial para promover o desenvolvimento sustentável da Amazônia e a adaptação climática para essa nova realidade, na qual as cheias e as secas dos rios, as queimadas e o desmatamento vêm se intensificando a cada ano. Os projetos construídos pelas próprias comunidades garantem o protagonismo desses povos, promovendo seus modelos de desenvolvimento que respeitam os limites da natureza e conservam os recursos naturais para as presentes e futuras gerações. 

A adaptação climática na Amazônia deve passar, necessariamente, pelo apoio às soluções locais. As comunidades tradicionais, como indígenas, ribeirinhos e quilombolas, possuem um conhecimento ancestral sobre o manejo sustentável dos recursos naturais, as mudanças no ambiente e os impactos que afetam não somente a Amazônia, mas toda a Terra. Investir nas comunidades locais e nos territórios é investir no futuro da Amazônia e do planeta. Por isso, o Fundo Casa Socioambiental tem ampliado a escala de apoios às iniciativas comunitárias, garantindo que os recursos promovam transformações para essas populações que, com seus próprios modos de vida, garantem a preservação e conservação da biodiversidade.



Sobre o autor: Angelo Ricardo Sousa Chaves é Engenheiro Ambiental formado pelo Centro Universitário Luterano de Manaus, técnico agrícola e técnico em Manejo de Agroflorestas formado pelo Instituto Federal do Amazonas. Ribeirinho, extrativista, nascido e criado às margens do Rio Tapajós na comunidade do Surucuá, na Resex Tapajós-Arapiuns (PA), tem grande experiência com projetos socioprodutivos, recuperação de áreas degradadas e desenvolvimento de alternativas de geração de renda para populações tradicionais na Amazônia. Desde 2022 é Gestor de Programas no Fundo Casa Socioambiental.

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