Foto: Shutterstock / Dragana Gordic
Por Larissa Ferreira
O círculo de doação pode ser uma estratégia para fortalecer a filantropia comunitária e de justiça social, ao reunir pessoas doadoras e causas/organizações a serem apoiadas de maneira mais horizontal e dialógica.
O fato é que, seja o círculo de doação iniciado por pessoas doadoras que se reúnem, juntam suas doações e decidem o que vão apoiar ou por uma organização que tem a finalidade de arrecadar recursos para fortalecer a sua atuação, existem poucos estudos sobre essa maneira de mobilizar doações no Brasil. Ainda mais, no que diz respeito às formas de mobilizar doações coletivas adotadas por grupos não formalizados e/ou grupos historicamente marginalizados.
Porém, pode-se notar que algumas organizações que atuam no campo da filantropia comunitária e de justiça social têm buscado se aproximar dos mecanismos do círculo de doação, tais como, o Fundo Baobá, o FunBEA – Fundo Brasileiro de Educação Ambiental e o Instituto Comunitário Grande Florianópolis (ICOM). Os três são fundos integrantes da Rede Comuá e estão em diferentes momentos no que diz respeito à experimentação de estratégias de círculos de doação.
Além dos três fundos, organizações sociais, como a Associação Acorde, localizada entre os municípios de Cotia (SP) e Embu das Artes (SP) vivenciou durante dois anos um círculo de doação, assim como, o caso de pessoas que promovem círculos de doação reunindo pessoas interessadas em fazer parte.
As experiências mencionadas fizeram parte da pesquisa da primeira edição do Programa Saberes da Rede Comuá. As pessoas representantes dos fundos, Baobá e ICOM, da organização Associação Acorde e um pesquisador do campo da filantropia, que iniciou um círculo de doação no começo de 2023, concederam entrevistas para compartilhar suas experiências.
As entrevistas foram realizadas entre os meses de março à julho de 2023, com a intenção de compreender alguns aspectos das estratégias do que cada um(a) considera círculos de doação, tais como, as principais características, o relacionamento com as pessoas que integram o círculo de doação, transparência e os principais desafios e conquistas.
As experiências de círculos de doação demonstram que eles podem ser impulsionados por diferentes motivações, tais como, o desejo de investir em justiça social de um território; a resposta à um contexto emergencial como de uma pandemia; uma estratégia de complementar a captação de recursos de uma organização; e pela própria experiência de criar um círculo de doação, visto que é algo ainda incipiente no Brasil.
Para a maior parte das pessoas entrevistadas, suas experiências com os círculos de doação é algo recente (menos de cinco anos atrás) e está em fase de consolidação e experimentação. Assim como, eles apresentam diferentes focos de pessoas doadoras, sendo alguns focados mais em empresas, outros em pessoas físicas, e outros em grupos específicos de atuação profissional e/ou atuação na área da filantropia e terceiro setor.
Em todos os casos, algo essencial para os relacionamentos promovidos pelos círculos de doação é a comunicação, tanto com as pessoas/empresas doadoras quanto com as iniciativas que recebem apoio. A comunicação é vista como um ponto-chave para fortalecer a transparência e a cultura de manter um diálogo permanente com quem integra o círculo de doação.
Um ponto que chama atenção no relacionamento com as pessoas/empresas doadoras, destacado pelo ICOM, é o engajamento para participar do círculo de doação a partir do convite de empresas que já fazem parte ou então, no caso das pessoas físicas, serem pessoas que já tiveram alguma ligação com o ICOM. Isso é interessante pois aponta para a importância da criação de vínculos de confiança, os quais possibilitam ampliar relacionamentos e apoio de novas pessoas/empresas doadoras.
As organizações que possuem o papel de estruturar e conduzir os círculos de doação percebem que suas ações precisam garantir os recursos necessários para o funcionamento do círculo, investir no desenvolvimento institucional das iniciativas/organizações que apoiam, estar atenta ao seu papel estratégico no campo da filantropia e manter uma comunicação constante das ações realizadas e resultados alcançados.
Os desafios compartilhados por estas experiências estão relacionados à sustentabilidade do próprio fundo/círculo de doação, a sensibilização para a causa da justiça social, assim como, para o engajamento em ações que consistam em apoiar programas estruturantes e não ações emergenciais. Outros desafios compartilhados são compreender o perfil de quem doa e chegar em consensos para a tomada de decisões no coletivo.
Em relação às conquistas, estas estão relacionadas à divulgação e compartilhamento do trabalho realizado por suas organizações, a capacidade de multiplicar o que foi doado pelas iniciativas apoiadas e o desejo de que as pessoas saiam inspiradas dessa experiência e motivadas a criar outros círculos de doação em suas redes.
O círculo de doação, enquanto estratégia de organizações que atuam no campo da filantropia comunitária e de justiça social aparenta ser algo recente, porém, já apontam para novas possibilidades de fortalecer o trabalho das iniciativas e grupos parceiros, na busca de construir relacionamentos que de fato estejam alinhados com as demandas sociais.
Quer saber mais sobre os achados das experiências internacionais de círculos de doação e conferir as referências deste texto? Acesse o relatório completo da pesquisa! Clique aqui.
Larissa Ferreira é gestora e Analista Ambiental, atualmente é mestranda em Educação na UFSCar. Atua como educadora voluntária no FunBEA – Fundo Brasileiro de Educação Ambiental. Fez parte da primeira edição do Programa Saberes da Rede Comuá, com a pesquisa intitulada “Filantropia Comunitária e Educação Ambiental: análise do círculo de doadores do Litoral Norte de São Paulo”.